OS DESÍGNIOS DE DEUS e os ataques do Hamas a Israel
Para quem não acompanha e estuda o fenómeno terrorista de perto, o ataque do Hamas a território israelita este fim de semana pode parecer muito estranho e até ilógico.
De facto, são um grupo, nem sequer um Estado, que ataca um verdadeiro potentado militar com provas dadas neste tipo de conflito.
Não me desviando do assunto, no contexto militar atual, só Israel tem provado saber combater e, assim vencer, guerras assimétricas, isto é, que recorre às designadas tática de guerra não convencional tais como a guerrilha, a sabotagem e o ataque seletivo. Isto porque as suas Forças Armadas, em especial as forças especiais, atuam utilizando as mesmas técnicas e táticas de combate, não raras vezes no limiar da convenção de Genebra.
Desta forma atacar Israel pode parecer uma estupidez do ponto de vista militar.
Acresce a este facto a própria circunstância atual do Hamas.
Desde a assinatura do tratado de paz com a Fatah, com quem, durante 4 anos, teve em guerra fratricida pelo domínio do governo dos Territórios Palestinianos (em especial facha de Gaza), que o Hamas luta, literalmente, pela sobrevivência.
Sendo uma força sunita num contexto maioritariamente xiita, o Hamas viu, nos últimos 10 anos, a sua base de apoio, de recrutamento e de financiamento ir, lentamente, desaparecendo.
Desde a Al-Qaeda, à própria OLP, passando pelos regimes do Iraque, todos sunitas, viu também os "estados amigos" ir perdendo o interesse pela sua causa.
Países como a Arábia Saudita, o Kuwait e o Qatar que, anteriormente, apoiavam este tipo de movimentos, começaram, há cerca de 5 anos, a encetar movimentos diplomáticos pró-ocidente e mesmo pro-Israel.
Depois da assinatura dos acordos de Abrão em 2020 entre Israel e os Emirados Árabes Unidos, Marrocos e Sudão, que ficou a porta aberta para que outros países se juntem a este esforço de alcançar uma paz estável e duradoura para a região.
Lembremo-nos que a própria Arábia Saudita, bastião sunita e grande guardião dos locais sagrados do islão como Meca e Medina, tem, atualmente, relações comerciais e diplomáticas (ainda que somente oficiosas) com o Estado de Israel. Não dias de hoje há voos diários entre as duas capitais, trocas e acordos comerciais em áreas estratégicas e mesmo troca de ativos de elevado potencial.
A situação desta falta de apoio agrava-se pela continuidade e mesmo incremento do apoio às fações xiitas por parte do Irão.
Embora o Irão apoie, há anos, o Hamas, este sempre foi o "parente pobre" da política externa de destabilização de Teerão.
Ficar mais fraco quando os nossos oponentes ficam mais fortes é sempre um sinal de alarme para qualquer organização.
Desta forma o Hamas luta, atualmente, pela sobrevivência.
Precisa, urgentemente de garantir o seu financiamento, as suas bases de recrutamento, a renovação dos seus órgãos dirigentes e, antes de mais e primeiro que tudo, a sua relevância em termos de influência e de pressão internacional.
E como um grupo terrorista garante tudo isso?
Desencadeando ataques.
Logo, e pela minha análise, estes ataques encontram as suas razões e motivações mais em razões internas do que externas.
É uma mensagem clara da existência do Hamas, uma "prova de vida", um grito estridente de sobrevivência.
Com estes ataques o grupo terrorista, prova que ainda existe, que ainda é capaz de infringir dano ao eterno inimigo "sionista" (a única coisa que une xiitas e sunitas radicais), que ainda é capaz de mobilizar meios humanos e materiais para atingir os seus objetivos e, fundamentalmente, que merece o apoio do Irão e que é útil aos seus propósitos.
No entanto, embora se entenda a motivação deste ataque, as suas consequências podem ser contraproducentes a todos os níveis.
Em primeiro lugar coloca Israel numa posição em que só uma reposta forte, musculada e sem precedentes é possível. Benjamin Netanyahu já veio reclamar vingança e todos sabemos como agem os Israelitas quando se sentem ameaçados. A missão "Ira de Deus", desencadeada pelos ataques nos jogos olímpicos de Munique em 1972 ainda estão bem presentes, assim como as duas guerras (dos seis dias em 1963 e a do Yom Kippur em 1973) em que os atacantes árabes além de serem repelidos foram literalmente humilhados.
O Hamas, em termos militares, tinha uma hipótese: num ataque relâmpago enfraquecer as defesas israelitas ao ponto de esta não conseguir reagir em tempo útil.
Como é óbvio não conseguiu.
Agora o Hamas terá de suportar toda a força e toda a ira das Forças Armadas israelitas.
Outra consequência negativa para o Hamas é ter, com este ataque, congregado o apoio a Israel por parte da comunidade internacional tanto não árabe como mesmo a árabe.
A barbaridade, crueldade, arbitrariedade, fanatismo e desumanidade dos ataques provou uma onda geral de contestação e indignação, fazendo, com que mesmo Estados que se começavam a inclinar para retirar o Hamas da lista de grupos terroristas, perdessem, agora, todas as dúvidas: o Hamas é, de facto, um grupo terrorista e as suas ações terrorismo "puro e duro" e, logo, ilegal, ilegítimo e condenável.
Porque, nestas circunstância, o simples acto de não condenar, implicar o apoio a estas ações.
O Irão ficou sozinho no apoio aos ataques provando que a comunidade árabe está mais apostada no sucesso das relações comerciais do que nas questões de fé e de ideologia. Uma paz efetiva e duradoura na região permitirá economias fortes, relações comerciais estáveis, turismo, investimento e a criação de uma economia cada vez mais independente do petróleo que é uma grande preocupação dos países do golfo atualmente. Completamente dependentes dos combustíveis foceis, as economias do golfo têm de encontrar, rapidamente, alternativas viáveis a este mercado que os sustenta há quase 50 anos, pois a tendência do comércio do petróleo é de cair cada vez mais em consequência das crescentes limitações ao seu consumo por parte dos países a braços com alterações climáticas graves.
Desta forma o "anti sionismo" e a Jihad perdem força perante, primeiro, o assumir definitivo que o Estado de Israel é uma realidade e assim continuará e, em segundo, que o bem-estar e prosperidade dos povos é preferível a idealismo anacrónicos e radicais.
Este ataque e as suas consequências só vão demostrar, tanto a Estados como a opiniões públicas, que qualquer paz é sempre preferível a qualquer guerra, tenha esta as razões que tiver.
Assim tanto o Hamas como o Irão saem de toda esta situação mais expostos, mais isolados, mais fracos e não o oposto.
Se os efeitos imediatos e primários foram de algum sucesso para os radicais islâmicos, os efeitos secundários serão avassaladores.
Inclusive, e conhecendo Israel e o seu modus operandi, não seria de estranhar que, brevemente, o Hamas se visse sem liderança pois a MOSSAD não costuma deixar impunes este tipo de ações.
Veremos, nos próximos dias, como se movimenta, de facto e no terreno, todas as peças de um "xadrez" cada vez mais extremo, mas, na minha opinião, cada vez mais perto de se resolver.
Até acho que, com este ataque, o Hamas contribuiu decididamente para uma paz há muito desejada.
Como dizia um Judeu nascido em Nazaré há 2.000 anos "os desígnios de Deus são insondáveis"….