O MUNDO EM CONVULSÃO: OU A NOSSA INCAPACIDADE DE ENFRENTAR A NORMALIDADE

08-07-2024


Os jornais e os noticiários televisivos enchem-se de notícias, os comentadores andam num frenesim, uns anunciando desgraças, outros augurando guerras mundiais ou crises cataclísmicas.

Os políticos enraizaram-se num discurso de pessimismo moderado, tirando partido óbvio de populações cada vez mais assustadas, com menos liquidez, com menos poder de compra, sufocadas por cargas fiscais diretas e indiretas, com as empresas sem capacidade de serem competitivas nos mercados externos devido às disparidades entre regras e normas que são obrigadas a seguir, ao preço da mão-de-obra e às obrigações sociais e fiscais a que estão nefastamente condenadas.

E tudo isso tem uma face visível, quase palpável, que se reflete no espectro político mundial, mais especialmente no "ocidente alargado": a França, a Itália e a Hungria alinharam-se, cada vez mais, por discursos populistas e de extrema-direita; os Estados Unidos estão prestes a reeleger Donald Trump como Presidente; outros países "balançam" entre extremos, diminuindo os partidos tradicionais do "arco do poder" a representações medíocres nos diversos parlamentos.

As ditaduras e as autocracias prosperam no panorama internacional, desde a Rússia à Turquia, passando por muitos países do norte de África, a Coreia do Norte, o Irão e, claro, o gigante do Oriente: a China.

Não se consegue terminar com a guerra na Ucrânia, nem com o conflito israelo-palestiniano, com a crescente violência no Sahel, com a pirataria no Golfo de Áden ou com a pressão no mar da China...

O mundo parece estar em ebulição!

Guerras mundiais são anunciadas todos os dias e fome e desespero futuros dados como certos!

Afinal, o que está a acontecer????

A resposta é muito simples e clara:

NADA!

O sistema político que até agora vigorou teve origem no final da Segunda Guerra Mundial, isto é, há quase 80 anos, tempos em que a Europa estava arrasada, a África colonizada e a América Latina envolta em pobreza e exploração por parte das grandes potências.

A China dava os primeiros passos no comunismo com o maoísmo, a Rússia dominava parte do globo como União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, os Estados Unidos da América surgiam como uma potência incontestável em termos económicos (impulsionados pelos lucros da guerra e do "Plano Marshall"), mas também militares devido ao ascendente nuclear.

Começava-se a "corrida espacial", lançando satélites em órbita que mais não faziam que emitir um "bip", a comunicação era efetuada por carta ou telex (os mais novos vão ver o que é na internet), internet essa que ainda ia demorar mais de 30 anos a surgir.

Vou-me ficar por aqui para não ser exaustivo, pois já perceberam a ideia.

O que tem o mundo de hoje de similar ou sequer comparável ao mundo desses anos 50, em termos históricos relativamente próximos, mas em termos culturais, sociais, tecnológicos, económicos, geopolíticos e geoestratégicos completamente diferente, quase antagónico, mesmo irreconhecível?

Nada ou quase nada!

Então, se o mundo mudou tão radicalmente, como é que os sistemas políticos, que é suposto gerirem esse mesmo mundo, mantendo a ordem e o progresso, não mudam?

Como podemos esperar que métodos, sistemas, estratégias e políticas com 80 anos continuem a ser eficazes, enquadrados, que resultem?

Por isso afirmo que nada se está a passar!

O mundo está simplesmente a fazer o que sempre fez desde a sua criação há dezenas de milhões de anos: evoluir, mudar, transformar-se, adaptar-se.

Tal como em toda a natureza, também para os povos e para as nações a única constante é a mudança.

E o sistema geopolítico não só devia acompanhar essa natural mudança, como a devia, com inteligência e perspicácia, antecipar, não esperando que os problemas e as convulsões surgissem para os resolver, não actuando no efeito, mas mitigando a causa.

A única razão de todas estas convulsões é um conjunto de políticos que estão em negação, que se recusam a enfrentar o óbvio, que desmentem o factual e repudiam o inevitável.

Políticos que acreditam que conseguem resolver com métodos e estratégias de anteontem problemas e questões de hoje, que acham que os povos, as sociedades, os países e as nações "congelaram" no tempo e que não evoluíram a uma velocidade vertiginosa como, de facto, aconteceu.

A classe política tem de entender que os tempos são outros e que, sendo outros, precisam de novas medidas, novas políticas, novas soluções e, já agora, de políticos com outras dinâmicas, com uma nova mentalidade, com uma nova postura.

Porque se assim não acontecer, sucederá o óbvio: se não houver "gente boa" para governar, será a "gente má" a fazê-lo.

A grande e incomparável Golda Meir dizia que o "mal vence quando os bons falham" e, quase como sempre, tinha razão.

Movimentos populistas, extremos e radicais só estão a conquistar terreno porque não há quem lhes faça frente nesses ataques; as ditaduras só prosperam porque não há alternativas democráticas credíveis; os conflitos só se multiplicam porque não há quem consiga os consensos necessários para a paz.

Não se passa nada porque o mundo simplesmente está a mudar, o problema é que não há quem esteja a fazer a gestão séria, inteligente, estratégica e eficaz dessa mudança.

É urgente políticos que saibam gerir a mudança, políticos que entendam o mundo e as sociedades como elas são, políticos dispostos a defender a democracia, a liberdade e o Estado de Direito, mas que o façam para este maravilhoso mundo novo que todos os dias evolui, todos os dias muda, todos os dias é um novo mundo, desde sempre e para sempre.