O COMANDANTE ARNAUT e a (in)justiça impune dos fortes

14-09-2022

"Se servistes à pátria, que vos foi ingrata, vós fizestes o que devíeis, ela o que costuma."

Padre Antônio Vieira , "Sermão da Terceira Quarta-Feira da Quaresma", na Capela Real, 1669



O Comandante Arnaut foi ilibado!

Deixem-me dizer antes assim: o Comandante Arnaut, obviamente, foi ilibado.

Reparem que podia ter acontecido que o Comandante fosse, de facto, culpado de algum ou alguns crimes pela sua prestação nos trágicos incêndios de Pedrogão em 2017.

Muita coisa correu mal e não era inusitado que o Comandante tivesse de responder criminalmente por algumas das suas decisões ou actos.

Só não erra quem não faz, e, por vezes, estamos tão desesperados por dar o nosso melhor que cometemos o nosso pior.

Mas, logo aqui, há uma questão muito séria que se levanta:

Se tal tivesse acontecido (e, como confirmou o coletivo de juízes, não aconteceu) o Comandante Arnaut nunca, mas nunca mesmo, poderia ser acusado sozinho.

Naqueles fatídicos dias, talvez como nunca, estava reunida uma estrutura, uma complexa organização, de comandantes, diretores, administradores, presidentes de tudo quanto era autoridade e instituto e ministérios, todos eles hierarquicamente superiores ao Comandante Arnaut e que, eu saiba, não se sentaram no banco dos réus.

Quem comanda, quem lidera, assume, em pleno e sem exceção, a responsabilidade pela estrutura que é por si comandada.

Ora: onde estão todos aqueles que comandaram o Comandante Arnaut naqueles dias, que, como se sabe, lhe deram ordens, instruções que puseram e dispuseram dos seus meios e dos seus homens?

Ao acusar o Comandante Arnaut e deixar todos os seus superiores fora da acusação o Ministério Público mostrou ser incompetente, improcedente, ignorante do que estava a apreciar, profundamente influenciado e dramaticamente politizado.

Ao dar provimento à acusação do Ministério Público e permitir que o caso fosse a julgamento, o sistema judicial provou, mais uma vez, ser "forte para os fracos e fraco para os fortes".

Valeu ao Comandante a solidariedade dos seus Camaradas que nunca o deixaram, nunca o abandonaram, demonstrando uma união e um "espírito de corpo" que, infelizmente, não é muito habitual no contexto dos bombeiros portugueses.

Dito isto, ficam aqui duas considerações:

Primeiro: alguém peça desculpa a este Homem!!!!

O que lhe fizeram não se faz a ninguém. Mas peçam publicamente. Ilibar não chega.

Para Homens como me parece ser o Comante Arnaut (que, afirmo, não conheço de lugar nenhum), homem da serra e da terra, a honra vale bem mais do que qualquer papel, leve ele o selo de quem leve e o bom nome não é, como para muitos urbano depressivos formadores de opiniões, algo de que até se abdica desde que seja mencionado.

A honra e o bom nome são algo de sagrado, diz a Lei: não o pratica quem a aplica, está visto.

O sistema judicial tem de demostrar alguma decência, alguma maturidade e assumir que errou, errou muito e profundamente e assumir, perante o Arnaut, o "mea culpa". 

Foram 5 anos que, para o Ministério Público, para alguns órgãos de comunicação social e para alguns grupos de interesse, este homem foi culpado antes de provada a sua culpa.

Não quero imaginar a angústia, o desespero, a amargura desta pessoa ao longo destes 5 anos.

Peçam-lhe desculpas: Qualquer coisa menos do que isso será indecente, inconcebível, inadmissível.

Em segundo: sempre que um crime que foi, sem margem para dúvidas, cometido e um suspeito é ilibado, tem de se tirar uma conclusão óbvia: os culpados, os reais e verdadeiros culpados, estão à solta, estão incólumes, estão impunes.

Hora, em Pedrogão, em Junho de 2017 cometeram-se crimes, muitos e graves, disso não há a mínima culpa.

Quem são os culpados do que aconteceu naqueles dias? Onde estão eles? Quem assumirá a culpa dos 66 mortos, 254 feridos (7 deles graves), dos 53 mil hectares ardidos, dos milhões de prejuízo, dos milhares de pessoas que viram a sua vida profunda e permanentemente afetada por aquele inferno? Onde andam os que não cumpriram o seu dever, a sua função, a sua obrigação?

Ou será que a culpa está tão alta que nem a nossa pequena e imatura justiça lá chega? Ou será que a culpa é tão forte que a cobardia dos nossos impotentes magistrados não tem coragem de lá chegar?

Não vos sei responder e até temo essa mesma resposta.

Só sei uma coisa: quase nada se aprendeu com aqueles dias.

Este julgamento prova-o.

E quando não aprendemos com o passado arriscamo-nos a que ele se repita.