A INTELLIGENCE ESTRATÉGICA NO PROCESSO DE DECISÃO DO SECTOR BANCÁRIO

16-04-2024


Muito poucos setores têm evoluído tanto e tão rapidamente como o sector bancário.

Este setor estratégico sustentou, de facto, a alavancagem da crescente economia de mercado nos últimos 50 anos e tornou possível a globalização tal como a entendemos. Em simultâneo viu-se, ele próprio, alavancado pelo sucesso desse mesmo progresso que o mesmo permitiu e sustentou.

Desta forma, nos dias de hoje, o sector bancário que, há 40 anos, se baseava em cheques, notas de crédito e levantamentos de numerário ao balcão, é um dos mais dinâmicos e evoluídos em termos de oferta e soluções tanto de relações entre organizações como com o cliente final, tanto no setor corporativo como estatal.

Também se tornou pioneiro na otimização de processos e na dinamização dos fluxos de informação (nomeadamente digital) o que gera a capacidade de, cada vez mais e melhor, criar produtos, soluções e serviços para o cliente tanto em termos de áreas tradicionais, tais como crédito, operações bancárias ordinárias e mesmo investimento, como em áreas inovadoras como tornar possível ao cliente comum o acesso aos mercados bolsistas e cambiais, investimento em criptoativos e em derivados financeiros.

Estas notáveis conquistas condicionaram como o sector opera internamente.

O aumento exponencial das transações e dos serviços prestados pelo setor bancário tanto a empresas e organizações como a cidadãos e pequenos investidores criou um aumento exponencial dos fluxos de informação gerados pelo próprio sistema, provocando avalanches de dados e informes que tem de ser processados e, posteriormente, analisados pelos decisores para que possam tomar, precisamente, uma decisão.

Por outro lado, este imenso dinamismo abriu as portas a novas oportunidades para o sector.

Com possibilidade de gerir, a grande velocidade e com grande eficiência, enormes fluxos de informação, os bancos podem expandir-se em termos de públicos-alvo, permitindo, também, a expansão territorial com conquista de novos mercados e a diversificação das suas áreas de atuação e a sua panóplia de produtos.

Mas, como em tudo na vida e em todas as áreas de negócio, esta verdadeira mutação do sector trouxe as suas consequências.

O aumento da atividade nas áreas descritas aumentou, obviamente, a geração de informação que necessita de ser analisada e processada, assim como reduziu, em muito, o tempo disponível para a análise dessa mesma informação e tomada de decisão em relação às operações. Não se pode ignorar que, por exemplo, uma das consequências diretas da expansão territorial e de públicos-alvo por parte de instituições financeiras provocou, diretamente, o aumento da concorrência. Se, no "antigo sistema", um banco brasileiro ou angolano nunca poderia ser concorrente direto de um banco português e vice-versa, hoje é mais do que natural e quase óbvio que o sejam.

Tudo isto aumentou, em muito, a exposição das instituições a realidades que saem da sua "zona de conforto" e "zona de influência". Nos "antigos tempos" uma instituição bancária operava em áreas geográficas restritas, em mercados tradicionais e limitados, com clientes com perfis muito homogéneos.

Hoje não!

Públicos, mercados e áreas de ação são muito diversificadas, cada uma com as suas nuances, características, comportamentos, abordagens e idiossincrasias que é necessário dominar e conhecer de modo a poder retirar o maior proveito de cada um desses mercados, de cada um desses nichos, assim como, também, evitar os perigos e riscos de cada um.

Claro e óbvio, por último, que a expansão do sector e das instituições que o constituem aumentou, em muito, os montantes envolvidos e transacionados tanto em ativos líquidos como em derivados.

Num sistema altamente dinâmico e competitivo a liquidez é um imperativo, mas a capacidade de deter essa liquidez é cada vez menor exatamente devido à dinâmica dos mercados. Assim a necessidade de crédito é atualmente muito grande, a interdependência entre instituições enorme e o equilíbrio do sector é muito ténue, assim como a sua volatilidade, aumentando, muito, o risco das operações.

E, como também é obvio, todas as mutações, todas as evoluções trazem consequências, mas também trazem novos desafios e neste contexto os desafios são enormes.

Em primeiro lugar é a quantidade de informação que é preciso processar e o curtíssimo tempo que se tem para o fazer. Também é um desafio enorme, com tanta informação e tão pouco tempo, ter a capacidade de análise, fundamentalmente de antevisão, dos diversos contextos e circunstâncias que afetam as operações a decorrer e que, como já se referiu, envolvem cada vez mais investimento. Este aumento dos montantes de investimento, com capitais nem sempre próprios e, logo, a consequente exposição a intervenientes externos aumenta, em muito, os efeitos, as repercussões e as consequências das decisões tomadas.

Atualmente, também devido ao esmagamento das margens de lucro, a capacidade de resiliência de uma instituição a uma má decisão que conduza a resultados negativos é muito reduzida, podendo, uma má operação, pôr, inclusive, em risco a sobrevivência da instituição bancária.

Como a situação não tivesse já complexa o suficiente também os fatores influenciadores do mercado alteraram-se substancialmente.

Se, antes, o sector bancário tinha de estar atento aos indicadores económico-financeiros e, de alguma forma, aos indicadores geopolíticos e geoestratégicos (onde tem origem, nos anos 80 e 90 a Business Intelligence), atualmente, com a diversificação dos públicos, dos mercados e dos produtos, o setor bancário tem de estar atento a um número cada vez maior de influenciadores. Desde a cultura, à sociedade, até às "tendências", ao "trendy" e à Engenharia Social através das redes sociais, aos processos de Engenharia Humana, à Inteligência Artificial generativa, tudo pode influenciar um negócio, uma operação, uma instituição. Operações fracassam já não somente por motivos económicos, financeiros ou políticos, mas por causa de um "post" de um "influencer" ou de uma "fake news" que se propaga por milhões de indivíduos, por todo o planeta, em segundos e geram "entusiasmos" ou "pânicos" nos mercados que, com acesso imediato aos seus ativos pelas "apps", geram ordens de venda, de compra, de liquidação, de transferência e tudo isto em segundos.

A emotividade e a volatilidade dos mercados é cada vez mais alta, em detrimento da racionalidade quase aritmética de outros tempos (mas que também não evitou grandes crises), o que faz com que a estabilidade dos mercados dependa, cada vez mais, do fator humano e dos seus comportamentos emotivos e não das oscilações do setor financeiro e da atividade política.


Para quem trabalha no sector bancário a conjugação destes fatores assemelham-se à descrição do apocalipse.

Um contexto que, sem dúvida nenhuma, cada vez apresenta mais oportunidades de negócios, mais mercados emergentes, mais potenciais clientes é também um contexto cada mais volátil, instável, reativo e emotivo em que decisões que podem impactar seriamente os mercados, as instituições e até as nações tem de ser tomadas em segundos baseados em imensos fluxos de informação, nem sempre assertivos e confiáveis.

Foi para dar resposta a todos estes desafios e, fundamentalmente, para transformar esses desafios, esses riscos, em proveito, lucro e sucesso que surgiu, há perto de 10 anos, a STRATEGIC INTELLIGENCE (SI), ou, em português, a Inteligência Estratégica.

A SI nada é mais que a aplicação da Intelligence de Estado, das suas técnicas, métodos e processos ao mundo empresarial e corporativo. O que antes só se fazia nos "Serviços Secretos" dos Países de modo a proteger a sua soberania e dar-lhe ascendente sobre os opositores e inimigos no contexto político, diplomático e militar está, agora, ao dispor de empresas, organizações e instituições, com as devidas adaptações, óbvio.

Porque, de facto, o objetivo da Intelligence de Estado e da Intelligence Estratégica Privada é exatamente o mesmo 

"no mais curto espaço de tempo, utilizando o mínimo de recursos e com o mínimo de perdas atingir a vitória sobre o oponente"[1].

O objetivo central das SI é criar o que se designa por SDRs (SUPPORT DECISION REPORTs), isto é, Instrumentos de apoio à decisão, para que os decisores, através de um documento curto, claro, conciso e focado tenham, num curtíssimo espaço de tempo e de um modo muito resumido, todas as informações necessárias para tomar uma decisão informada, fundamentada e assertiva sobre um negócio, uma operação, um investimento.

Porque quando o tempo é reduzido e o risco é grande (a que se acresce o "custo de oportunidade") ter a capacidade de decidir com eficiência num muito curto espaço de tempo é fundamental para se sobreviver, manter no mercado e obter o sucesso e a vantagem.

Desta forma, a SI, em relação à BI, fornece aos decisores uma visão mais ampla e holística de todos os fatores que influenciam o mercado, desde os mais tradicionais como os indicadores económico-financeiros, geopolíticos e geoestratégicos até indicadores sociais, culturais, de tendências, de Engenharia Social, Engenharia Humana entre muitos outros.

E como vivemos num mundo em constante e permanente transformação em que tudo se pode alterar numa questão de segundos, a SI trabalha com um método de elaboração de cenários, atribuindo a cada um uma probabilidade de concretização e criando, também, para cada um, não só um plano de ação para a maximização dos proveitos como planos de contingência e de crise se algo, no processo, correr menos bem ou mesmo mal.

Assim, seguindo um processo lógico e coerente, aplicado a toda a instituição, não como mais uma ferramenta, mas sim como uma "cultura", mesmo uma "mentalidade" na tomada da decisão, consegue-se que desde a Administração à simples agência, através de adequação de métodos de operações e de formação de quadros, toda a instituição siga o mesmo método decisório.

Desta forma, e assim a SI, traz à instituição, no seu todo, uma consistência e uma segurança tanto em termos de estrutura como de processos muito difíceis de obter com outros métodos ou sistemas.

Com a análise constante do contexto nas suas mais diversas vertentes, a SI não só consegue antever os riscos, mas também identificar as oportunidades, reduzindo, em simultâneo o "perigo" de entrar em maus negócios como também a potencialidade de perder os bons.

Obtém-se, assim, uma melhoria significativa dos resultados, tanto do vista financeiro como económico.

Também consegue orientar as instituições, no plano tático e estratégico, isto é, com a uma antecedência de médio e até longo prazo, do que serão as futuras tendências, os mercados emergentes, as oportunidades mais lucrativas e, em simultâneo, também no médio e longo prazo, quais serão os mercados que entrarão em queda, as áreas que começam a perder rentabilidade ou indicadores de alerta em termos de negócios, organizações e operações.

Desta forma, e ao contrário de outras áreas que avaliam o risco, ou então analisam áreas especificas dos mercados, a SI reúne, numa mesma área, numa mesma prática, num mesmo método, a identificação de risco mas também o potencial de oportunidade, a capacidade de evitar prejuízo mas também a de gerar lucro e tudo isso de um modo rápido, assertivo e dinâmico, capaz de dar aos decisores instrumentos, em tempo real, que lhes permitam decidir com a maior fundamentação, consciência e assertividade humanamente possível.

Concluindo, embora a SI seja muito recente na sua aplicação ao setor empresarial e organizacional, em específico no setor bancário, tem mais de um século de experiência no aperfeiçoamento de técnicas, métodos e processos tanto operacionais, como táticos assim como, e fundamentalmente, estratégicos.

Quando, em 1909, o Comandante Sir Mansfield George Smith-Cumming criou, no Reino Unido, o Secret Service Bureau, os primeiros serviços de informações e inteligência estratégica devidamente organizados no mundo (hoje SIS – Secret Intelligence Services de que fazem parte os "famosos" MI5 e MI6), estava, por certo, longe de imaginar que essa sua ideia, essa sua visão e as suas metas e objetivos, um dia, não só serviriam para defender Nações e conduzir exércitos à vitória, mas também a de auxiliar gestores e decisores de empresas e conduzi-los ao proveito, à eficiência, à otimização, à maximização, ao sucesso e, também, claro, à Vitória!


Rui Costa e Silva

CEO e Senior Advisor na Realpolitik UK

r.silva@realpolitik.org.uk

www.realpolitik.org.uk

+351 935 621 953


[1] - MILITARY SCIENCE AND LEADERSHIP, Royal Military Academy Sandhurst - RMAS - 2023